Lucas 6
Lucas 6:35
35. Mas amai vossos inimigos; fazei o bem e emprestai, sem nada esperar em troca; e vossa recompensa será grande, e sereis filhos do Altíssimo; pois ele é bondoso para com os ingratos e maus.
Comentário de Haydock
Ver. 35. Nada esperando, mas meramente impelidos por um desejo de fazer o bem. Aqueles que só dão quando certos de ter um retorno maior, não dão, mas negociam com sua generosidade; no qual não há caridade. A.
Comentário de Lapide
Ver. 35.—Emprestai, nada esperando em troca. “Dos homens,” acrescenta o Siríaco, “para que recebais vossa recompensa de Deus.”
Nada, isto é, nenhuma garantia ou retorno de qualquer tipo. Cristo quer que emprestemos, não apenas sem exigir usura pelo empréstimo, mas também sem esperar uma bondade semelhante em troca. Pois o que é senão egoísmo e avareza, se empresto a outro para que ele, por sua vez, me empreste? Cristo aqui ordena a verdadeira benevolência que empresta livremente, contente que no tempo designado o empréstimo seja devolvido. Alguns, de fato, pensam que não deveria haver retorno, mas as palavras de Cristo não suportam esta interpretação. Pois aquilo que é emprestado sem expectativa de retorno, é dado, não emprestado, e torna-se não um empréstimo, mas um dom. Toletus, Lessius, Valentia e outros.
Portanto, buscar lucrar com um empréstimo é contrário ao significado da palavra e à natureza da transação. Pois a palavra mutuum (no Grego δανείζητε, mutuum date [dai em mútuo], Vulgata), implica que são de mutuo animo [ânimo mútuo], aqueles que dão por dever (Varro); ou, como Verius Marcellus melhor explica, mutuum significa o mesmo que meum tuum [meu teu], porque por sentimento amigável o meu se torna teu para as necessidades e carências presentes. Por isso S. Gregório Nisseno escreve: “Aquele que exige juros sobre um empréstimo é condenado como usurário;” pois um empréstimo é uma transação amigável, dada livremente e a ser livremente restituída. Cícero, Epist. ad Metellum.
Um homem de coração bondoso, portanto, emprestará àquele que está em necessidade, mesmo que tenha razões para acreditar que nunca será reembolsado, pois há muitos pobres que não podem, e muitas pessoas indignas que não devolverão aquilo que lhes é emprestado.
Daí um escritor espirituoso: “Se emprestas a teu amigo e pedes a devolução do empréstimo, perderás um ou outro;” e novamente: “Ao emprestar dinheiro, comprei para mim um inimigo e perdi um amigo.” Aquele, portanto, que empresta deve emprestar por amor a Deus, que recompensará ricamente, como está escrito: “Aquele que se compadece do pobre empresta ao Senhor.” Ver Prov. xix. 17.
Daí S. Crisóstomo: “O pobre recebe o dom, mas Deus se torna o devedor;” e S. Basílio (conc. 4 de Eleemosyna [Sermão 4 sobre a Esmola]) “Aquilo que estás prestes a dar ao pobre por amor a Deus, torna-se tanto um dom quanto um empréstimo,—um dom, porque não há expectativa de retorno—um empréstimo, por causa da bondade de Deus, que recompensará ricamente em nome deles aqueles que aliviaram as necessidades dos pobres.”
Pelo que podemos tomar em sentido cristão aquilo que está escrito: “Perde teu dinheiro por teu irmão e teu amigo.” Ver Eclo, xxix. 10, e meus comentários sobre isso. Mas quando os homens tomam o que é emprestado, sem pensar em devolvê-lo, ninguém está disposto a se tornar um emprestador.
Catena Aurea – Tomás de Aquino
CRISÓSTOMO: O Senhor havia dito que devemos amar nossos inimigos, mas para que não penseis que isto é uma expressão exagerada, considerando-a apenas como dita para alarmá-los, ele acrescenta a razão, dizendo: Pois se amais os que vos amam, que mérito tendes? Há, de fato, várias causas que produzem o amor; mas o amor espiritual excede a todas elas. Pois nada terreno o engendra, nem ganho, nem bondade, nem natureza, nem tempo, mas ele desce do céu. Mas por que maravilhar-se que não precise de bondade para excitá-lo, quando nem mesmo é vencido pela malícia? Um pai, de fato, sofrendo injustiça, rompe os laços do amor. Uma esposa, após uma briga, deixa seu marido. Um filho, se vê seu pai chegar a uma grande idade, fica perturbado. Mas Paulo foi àqueles que o apedrejaram para fazer-lhes o bem. Moisés é apedrejado [ameaçado de apedrejamento] pelos judeus, e ora por eles. Reverenciemos, então, o amor espiritual, pois ele é indissolúvel. Repreendendo, portanto, aqueles que estavam inclinados a esfriar, ele acrescenta: Pois até os pecadores amam aqueles que os amam. Como se dissesse: Porque desejo que possuais mais do que estes, não vos aconselho apenas a amar vossos amigos, mas também vossos inimigos. É comum a todos fazer o bem àqueles que lhes fazem o bem. Mas ele mostra que busca algo mais do que é o costume dos pecadores, que fazem o bem a seus amigos. Daí se segue: E se fazeis o bem àqueles que vos fazem o bem, que mérito tendes?
BEDA: Mas ele não apenas condena como infrutíferos o amor e a bondade dos pecadores, mas também o emprestar. Como se segue: E se emprestardes àqueles de quem esperais receber, que mérito tendes? pois também os pecadores emprestam a pecadores, para receberem outro tanto.
AMBRÓSIO: Ora, a filosofia parece dividir a justiça em três partes; uma para com Deus, que é chamada piedade; outra para com nossos pais, ou o resto da humanidade; uma terceira para com os mortos, para que os ritos apropriados sejam realizados. Mas o Senhor Jesus, ultrapassando o oráculo da lei e as alturas da profecia, estendeu os deveres da piedade também àqueles que nos injuriaram, acrescentando: Mas amai vossos inimigos.
CRISÓSTOMO: Pelo que conferireis mais a vós mesmos do que a ele. Pois ele é amado por um conservo, mas vós sois feitos semelhantes a Deus. Mas é marca da maior virtude quando abraçamos com bondade aqueles que desejam nos fazer mal. Daí se segue: E fazei o bem. Pois como a água, quando lançada sobre uma fornalha acesa, a extingue, assim também a razão unida à gentileza. Mas o que a água é para o fogo, tal é a humildade e a mansidão para a ira; e como o fogo não é extinto pelo fogo, assim também a ira não é apaziguada pela ira.
GREG. NISSENO: Mas o homem deve evitar aquela ansiedade funesta com a qual busca do pobre aumento de seu dinheiro e ouro, exigindo um lucro de metais estéreis. Daí ele acrescenta: E emprestai, nada esperando em troca; etc. Se um homem chamasse o cálculo severo de juros, roubo ou homicídio, não erraria. Pois qual é a diferença, se um homem, cavando sob um muro, se apossa de propriedade, ou a possui ilegalmente pela taxa compulsória de juros?
BASÍLIO: Ora, este modo de avareza é corretamente chamado em Grego [τόκος - tokos], de produzir, por causa da fecundidade do mal. Animais, com o tempo, crescem e produzem, mas os juros, assim que nascem, começam a gerar. Animais que geram mais rapidamente cessam mais cedo de procriar, mas o dinheiro do avarento continua aumentando com o tempo. Animais, quando transferem sua geração para seus próprios filhotes, eles mesmos cessam de procriar, mas o dinheiro do cobiçoso tanto produz um aumento quanto renova o capital. Não toqueis, então, no monstro destrutivo. Pois que vantagem há em que a pobreza de hoje seja escapada, se ela cai sobre nós repetidamente, e é aumentada? Refleti então como podeis restaurar-vos? De onde vosso dinheiro será tão multiplicado que parcialmente aliviará vossa necessidade, parcialmente restaurará vosso capital, e além disso gerará juros? Mas dizeis: Como ganharei meu sustento? Respondo: trabalha, serve, por último, mendiga; qualquer coisa é mais tolerável do que tomar emprestado a juros. Mas dizeis: o que é esse empréstimo ao qual a esperança de reembolso não está ligada? Considerai a excelência das palavras, e admirareis a misericórdia do autor. Quando estás prestes a dar a um pobre por consideração à caridade divina, é tanto um empréstimo quanto um dom; um dom, de fato, porque nenhum retorno é esperado; empréstimo, por causa da beneficência de Deus, que o restaura por sua vez. Daí se segue: E grande será vossa recompensa. Não desejais que o Todo-Poderoso seja obrigado a restituir-vos? Ou, se Ele fizesse algum cidadão rico vosso fiador, vós o aceitaríeis, mas rejeitaríeis Deus como fiador pelos pobres?
CRISÓSTOMO: Observai a natureza maravilhosa do empréstimo, um recebe e outro se obriga por suas dívidas, dando cem vezes mais no tempo presente, e no futuro a vida eterna.
AMBRÓSIO: Quão grande a recompensa da misericórdia que é recebida no privilégio da adoção divina! Pois se segue: E sereis filhos do Altíssimo. Segui então a misericórdia, para que possais obter graça. Amplamente difundida é a misericórdia de Deus; Ele derrama Sua chuva sobre os ingratos, a terra frutífera não recusa seu aumento aos maus. Daí se segue: Pois ele é bondoso para com os ingratos e maus.
BEDA: Seja dando-lhes dons temporais, seja inspirando Seus dons celestiais com uma graça maravilhosa.
CIRILO: Grande, então, é o louvor da misericórdia. Pois esta virtude nos torna semelhantes a Deus, e imprime em nossas almas certos sinais como que de uma natureza celestial. Daí se segue: Sede, pois, misericordiosos, como também vosso Pai celestial é misericordioso.
ATANÁSIO: Isto é, que nós, contemplando Suas misericórdias, as boas coisas que fazemos, as façamos não em relação aos homens, mas a Ele, para que possamos obter nossas recompensas de Deus, não dos homens.
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