Curso de filosofia elemental | Padre Jaime Balmes

Immanuel Kant

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Immanuel Kant 

O nome de Kant está na boca de todos que falam sobre a filosofia moderna; no entanto, ele é provavelmente um dos autores menos lido, já que poucos têm a paciência necessária, que de fato não deve ser pouca, para mergulhar em suas obras longas, obscuras e cheias de repetições, onde ocasionalmente brilha um grande talento. Nota-se um esforço para envolver suas doutrinas em uma linguagem hermética, que nos lembra os iniciados de Pitágoras e Platão. Kant exerceu muita influência na filosofia deste século e, muito particularmente, na Alemanha, onde se reúnem as duas condições mais adequadas para a leitura de suas obras: laboriosa paciência e amor pelo nebuloso. Enclausurado em seu gabinete em Koenigsberg, onde passou sua longa vida, que terminou aos oitenta anos em 1804, o filósofo pouco se preocupava com a realidade do mundo: isolado em seu "eu", à maneira de Descartes, dá às suas teorias uma direção muito diferente da do filósofo francês. Descartes logo sai de seu "eu" para se elevar a Deus e se comunicar com o mundo físico; mas Kant se estabelece ali definitivamente, como em uma ilha de onde é impossível sair sem se afogar nos abismos do oceano.

Kant não nega a existência de Deus, nem do mundo físico, nem da ordem moral: ele até admite essas coisas, alinhando-se ao senso comum; o que ele nega é que a razão possa chegar a elas. Sua Crítica da Razão Pura é a morte da razão. Seja como for, já que é necessário ter uma ideia de seu sistema, procurarei apresentá-lo da maneira mais clara possível, mantendo a brevidade.

Partindo de um fato de consciência, ou seja, do "eu", os primeiros fenômenos que se apresentam a Kant são as sensações e as representações internas que resultam delas. À explicação disso, ele dedica o que chama de Estética Transcendental.

Kant entende por sensação "o efeito de um objeto sobre a faculdade representativa, na medida em que somos afetados por ele". É importante notar que ele desconsidera absolutamente a natureza do objeto afetante e se concentra apenas no efeito que surge em nós, no puramente subjetivo.

Por intuição, Kant entende qualquer percepção que se refere a um objeto; assim, há intuição quando o conhecimento é considerado como um meio.

A intuição empírica é "a que se refere a um objeto por meio da sensação". Vemos uma árvore: a representação interna, na medida em que é uma afecção do "eu", é sensação; na medida em que se refere a um objeto (real ou aparente), é intuição empírica ou experimental.

O fenômeno é "o objeto indeterminado da intuição empírica". O que é isso que corresponde à representação, e que chamamos de árvore? Kant não sabe; mas isso, seja o que for, na medida em que é o termo ou ponto de referência da representação interna, ele chama de fenômeno, porque é algo que aparece; Kant desconsidera o que é em si.

A realidade da coisa em si mesma é o númeno. Até que ponto o fenômeno, o que aparece, está de acordo com o númeno ou a realidade, é outra questão que, por ora, o filósofo desconsidera.

Mesmo na ordem sensível, nem tudo provém da experiência; há algo a priori: o espaço. Para que certas sensações sejam referidas a objetos externos, ou seja, a algo que ocupe um lugar diferente do nosso, e até para que possamos representar as coisas como exteriores umas às outras, isto é, não apenas como diferentes, mas situadas em lugares distintos, devemos ter anteriormente a representação do espaço. Isso implica que a representação do espaço não pode provir da relação entre os fenômenos oferecidos pela experiência; pelo contrário, é indispensável pressupor essa representação para que a experiência seja possível. A representação do espaço, portanto, não é um produto da experiência; é uma condição necessária para o exercício da sensibilidade, uma forma a priori que existe em nós; um espaço como uma tábua rasa onde os fenômenos são pintados. Em si, não contém nada real; mas tudo o que é sensível pode ser retratado nele.

Disso decorre que, quando transferimos para o exterior aquilo que chamamos de extensão, aplicamos aos objetos algo que não lhes pertence, um fato puramente subjetivo: a forma, a condição de nossa sensibilidade; e, portanto, tudo o que chamamos de mundo corpóreo se reduz a um conjunto de representações internas, às quais damos, sem fundamento, uma realidade externa. Assim, a teoria de Kant leva diretamente ao idealismo; não se compreende como, admitindo esse princípio, seria possível evitar essa consequência.

Na primeira edição de sua Crítica da Razão Pura, Kant não se assusta diante do idealismo: pelo contrário, parece estabelecer sem rodeios a possibilidade de que tudo seja pura ilusão; pois ele afirma: "O conceito transcendental dos fenômenos no espaço é uma advertência crítica de que, em geral, nada do que é percebido no espaço é uma coisa em si; que o espaço é, além disso, uma forma das coisas que talvez lhes fosse própria se fossem consideradas em si mesmas; mas que os objetos nos são completamente desconhecidos; e que o que chamamos de objetos exteriores não é outra coisa senão as representações puras de nossa sensibilidade, cuja forma é o espaço, e cujo correlato verdadeiro, ou seja, a coisa em si, é por essa razão totalmente desconhecida e sempre será; mas sobre a qual jamais se deve interrogar a experiência" (Estética Transcendental, seção I).

A intuição do espaço é a forma da sensibilidade externa; mas há, nos fenômenos, tanto externos quanto internos, algo que chamamos de sucessão ou tempo: sem isso, não perceberíamos a nós mesmos. Assim, o tempo é a forma e a condição da sensibilidade interna ou dos fenômenos na consciência. O tempo é a priori, isto é, independente da experiência, pois torna a experiência possível na sucessão, assim como o espaço na extensão. Portanto, o tempo não está inerente às coisas, é uma condição puramente subjetiva de nossa intuição interna. Disso se segue que sabemos apenas que percebemos as coisas em uma sucessão, mas ignoramos se essa sucessão está nas coisas; visto que ela é apenas um fato puramente subjetivo, uma condição necessária para nossa experiência, não podemos atribuí-la aos próprios objetos sem violar as regras de uma lógica sã. Assim raciocina o filósofo alemão.

Vê-se, então, que Kant não se limita a dizer que o tempo não é uma coisa real distinta das coisas, no que concordaria com a maioria dos metafísicos; ele afirma que ignoramos se há nas coisas uma sucessão real, pois a sucessão que percebemos é uma condição puramente subjetiva, uma mera forma de nossa intuição. Assim, depois de ter colocado em dúvida a realidade da extensão, ele espalha a mesma dúvida sobre a realidade da sucessão, de modo que tudo o que se refere ao tempo e ao espaço não é para nós mais do que um conjunto de representações. E a ciência que tem por objeto o mundo não deveria se chamar cosmologia, mas fenomenologia, já que não se ocuparia do mundo ou cosmos, mas dos fenômenos.

Nessa doutrina está o idealismo de Berkeley. Fez-se essa observação a Kant, e ele procurou se explicar em um trecho que se encontra na segunda edição de sua Crítica da Razão Pura, e que transcrevo a seguir, tanto como prova de minha imparcialidade quanto para dar uma amostra do estilo deste filósofo:

"Quando digo: no espaço e no tempo a intuição dos objetos exteriores e a do espírito representam essas duas coisas tais como afetam nossos sentidos, não quero dizer que os objetos sejam uma pura aparência; porque no fenômeno os objetos, e até as propriedades que lhes atribuímos, são sempre considerados como algo dado realmente: no entanto, como essa qualidade de ser dado depende unicamente do modo de percepção do sujeito em sua relação com o objeto dado, esse objeto, como fenômeno, é diferente de si mesmo como objeto em si. Eu não digo que os corpos parecem simplesmente ser exteriores, ou que minha alma parece simplesmente ter-me sido dada em minha consciência: quando afirmo que a qualidade do espaço e do tempo (segundo a qual coloco o corpo e a alma como sendo a condição de sua existência) existe unicamente em meu modo de intuição e não nos objetos em si, estaria em erro se transformasse em pura aparência aquilo que devo tomar como um fenômeno: mas isso não acontece se se admite meu princípio da idealidade de todas as nossas intuições sensíveis. Pelo contrário, se se atribui uma realidade objetiva a todas essas formas das representações sensíveis, não se pode evitar que tudo se converta em pura aparência; porque, se o espaço e o tempo forem considerados como qualidades que devam estar, quanto à sua possibilidade, nas coisas em si, e se se refletir sobre os absurdos em que então se cai, dado que duas coisas infinitas que não podem ser substâncias, nem nada inerente a substâncias, e que, no entanto, são algo existente e até a condição necessária da existência de todas as coisas, subsistiriam mesmo que todo o resto fosse aniquilado, não se pode censurar o excelente Berkeley por ter reduzido os corpos a uma mera aparência" (Estética Transcendental).

Por esse trecho, percebe-se que Kant distingue entre pura aparência e fenômeno: por exemplo, aquilo que aparece como uma árvore não é, segundo Kant, uma coisa ilusória, ele apenas sustenta que o aparente não tem nada em comum com a realidade. Não destrói, portanto, a própria realidade ou a coisa em si; apenas afirma que essa coisa não é tal como aparece. Ele admite que, com relação a nós, o mundo é uma aparência, mas não que em si seja uma pura aparência. Duvido muito que Berkeley quisesse significar mais que isso: o filósofo irlandês não negaria a realidade dos seres que nos afetam, nem que os fenômenos da sensibilidade emanam de objetos reais; ele apenas queria afirmar que essas coisas não eram, como acreditávamos, objetos realmente extensos, o que lhe bastava para sua teoria idealista. Kant concede tudo isso, pois a extensão ou a forma do espaço ele reduz a um fato puramente subjetivo, ao qual nada extenso corresponde na realidade, mas uma coisa em si, que ignoramos o que é; portanto, ele admite a possibilidade do idealismo; e, como acrescenta que transferir a forma do espaço para o exterior conduz a absurdos, não apenas admite a possibilidade do idealismo, mas a necessidade dele; e, como no final aplica ao tempo o mesmo que ao espaço, resulta que seu idealismo é talvez mais refinado que o de Berkeley, pois destrói a existência e a possibilidade não apenas da extensão, mas também da sucessão (Filosofia Fundamental, livro XIV, cap. XII e XVII).

Além da faculdade de sentir, Kant admite a de conceber, ou seja, o entendimento; a primeira nos oferece os objetos em intuições, a segunda os concebe; aquela é uma receptividade ou potência passiva, esta uma espontaneidade: sem a sensibilidade, nenhum objeto nos seria dado; sem o entendimento, nenhum objeto seria concebido. Pensamentos sem matéria e sem objetos são vãos; intuições sem conceitos são cegas. O entendimento não tem outra matéria para seus conceitos senão aquela oferecida pelas intuições sensíveis; seu modo de conhecer é puramente discursivo, não intuitivo, ou seja, ele em si não tem um objeto dado, apenas pode discorrer sobre o que lhe é dado na representação sensível. Assim, para o conhecimento, é necessária a faculdade de pensar e a de sentir: elas não podem ser separadas sem destruir o conhecimento.

A ideologia de Kant, portanto, se reduz aos seguintes pontos:

  • 1º. A origem de todo nosso conhecimento está nos sentidos. O espaço é a forma, a condição das intuições sensíveis externas. O tempo é a forma da intuição interna.
  • 2º. Além da faculdade sensitiva, há a concepção ou entendimento.
  • 3º. As intuições sensíveis, por si só, não geram conhecimento; elas são cegas.
  • 4º. As intuições sensíveis são matéria de conhecimento à medida que são submetidas a conceitos ou à atividade intelectual.
  • 5º. O conhecimento humano não é intuitivo, mas discursivo. Esse sistema tem muita analogia com o dos escolásticos; apenas Kant lhe dá interpretações que conduzem a resultados funestos (Filosofia Fundamental, livro IV, cap. VIII).

Esses conceitos, considerados entre si, são meras formas lógicas na opinião de Kant; não contêm nada por si sós, sendo necessário aplicá-los a um objeto para que tenham valor e sentido; essa aplicação só pode ocorrer nas intuições sensíveis; fora disso, o uso desses conceitos é ilegítimo, é vão, não tem valor algum, sendo apenas um jogo do entendimento. Os conceitos são formas vazias que precisam ser preenchidas com fenômenos sensíveis: o que se chama categorias, se tomadas como conceitos das coisas em geral, se reduzem a simples funções lógicas; podem ser vistas como condições de possibilidade das próprias coisas, «mas sem que se possa mostrar em que caso sua aplicação e seu objeto, e, portanto, elas mesmas, possam ter, no entendimento puro e sem a intervenção da sensibilidade, um sentido e um valor objetivo.» (Lógica transcendental, livro II, cap. III.) Mas, então, estamos condenados a não saber nada além da ordem sensível, a não podermos nos elevar cientificamente ao conhecimento das coisas em si mesmas, pois nem mesmo em relação às coisas sensíveis podemos usar os conceitos, exceto na parte fenomenal ou na forma sob a qual se apresentam à sensibilidade; então, torna-se impossível o conhecimento de Deus, da alma e de tudo o que não seja fenômeno sensível... Kant não recua diante dessas terríveis consequências; e diz sem rodeios: Esses princípios (os do entendimento) são simples princípios da exposição dos fenômenos; e o pomposo nome de uma ontologia, que pretende fornecer um conhecimento sintético a priori das coisas em uma doutrina sistemática, como, por exemplo, o princípio da causalidade, deve ser substituído pela modesta denominação de simples análise do entendimento puro.

Os incautos que falam muito seriamente sobre o espiritualismo de Kant e seus triunfos sobre o sensualismo, vendo-o como um dos restauradores das boas doutrinas, tudo, é claro, sem terem aberto uma obra do filósofo alemão, e apenas por terem visto ele ser citado com elogios, esses incautos devem se aprofundar na exposição que precede; por ela saberão que Kant não admite mais conhecimento possível no homem além de simples funções lógicas sobre os fenômenos sensíveis; que Kant não admite nenhuma das demonstrações com as quais os mais eminentes metafísicos provaram a espiritualidade da alma; que ele sequer admite que se possa provar que a alma é substância; que também não admite nenhum dos argumentos com que se provou a existência de Deus; e que, por fim, o autor da Crítica da Razão Pura coloca o espírito em uma posição totalmente isolada, onde só lhe são oferecidos fenômenos sensíveis, sobre os quais ele pode pensar, mas dos quais é impossível sair, e quando tenta se estender a outras regiões com o auxílio da ciência, ao tentar descobrir o que há em relação a Deus, a outros seres e até a si mesmo, se vê reduzido a um desconsolador "quem sabe!"... Em vão se esforça para superar essa barreira: a Crítica da Razão Pura o encerra ali com rigor inexorável. (Ver Filosofia Fundamental, livro IV, IX e X. — Metafísica.)

As funestas teorias de Kant não podiam deixar de produzir efeitos desastrosos: desde então data o desvio filosófico da Alemanha; por um lado, o ceticismo mais dissolvente; por outro, o dogmatismo mais extravagante exposto em sistemas monstruosos.

Kant reduz toda a nossa ciência aos fenômenos sensíveis; e como a estes ele não confere nem mesmo a realidade da extensão e da sucessão, já que faz do espaço e do tempo meras formas subjetivas, resulta que toda a ciência é subjetiva, sem mais objetividade além da puramente fenomenal ou de aparência. Assim, tudo está no "eu": o entendimento é a faculdade das regras: «não é simplesmente uma faculdade de criar regras comparando fenômenos; é até a legislação para a natureza; ou seja, sem o entendimento, não haveria natureza, ou unidade sintética da diversidade dos fenômenos segundo certas regras...

Todos os fenômenos, como experiências possíveis, estão a priori no entendimento; e dele tiram sua possibilidade formal; da mesma forma que estão, a título de puras intuições, na sensibilidade; e só são possíveis por ela em relação à forma.» (Lógica transcendental.) Quaisquer que sejam as explicações com que Kant tenha pretendido suavizar as consequências de seus princípios, o certo é que o germe do erro estava neles; e o desenvolvimento desse germe não poderia ser impedido pelo filósofo de Koenigsberg. No estudo de suas obras formaram-se os metafísicos alemães: a filosofia do "eu" estava na Crítica da Razão Pura. De Kant a Fichte, há apenas um passo.

Curso de filosofía elemental | Padre Jaime Balmes
Páginas: 577-585