O MITO DA BOA GNOSE
O espírito gnóstico está tão distante do espírito de fé que não parece perigoso quando se apresenta tal como é. Por exemplo, nenhum católico tradicional teria a ideia de seguir a gnose da Maçonaria. Infelizmente, existe toda uma faixa de neo-gnósticos, que frequentemente se apresentam como fervorosos católicos e que fazem esforços prodigiosos para obter aceitação na intelectualidade do tradicionalismo. Para servir como vetor da penetração de suas doutrinas, eles inventaram o mito da Boa Gnose.
E sugerem usar, doravante, no linguajar eclesiástico corrente, a palavra gnose para designar a Ciência de Deus. Isso seria, dizem eles, devolver a essa ciência seu verdadeiro nome. Seria até, acrescentam, preencher uma lacuna na terminologia da Igreja latina. Pois a ausência dessa palavra impede a Igreja de cultivar os tesouros que estão nela e que ela já não conhece.
Respondamos de imediato que não há absolutamente nenhuma lacuna a ser preenchida. A coisa, e o termo para designá-la, existem desde sempre na Igreja do Ocidente: a "Ciência de Deus" não é nada além da velha teologia. É ela que formula, em linguagem explicativa humana, o que a Escritura exprime em linguagem condensada divina. Essa ciência de Deus, ou teologia, é certamente necessária para tornar acessíveis ao espírito dos fiéis as verdades reveladas misteriosamente expressas na Escritura e na Tradição apostólica. Mas, mais uma vez, essa ciência divina, elaborada sob a autoridade do Magistério, não esperou os neo-gnósticos para ser formulada na Igreja latina.
Que a Igreja grega, por sua vez, use a palavra gnose para designá-la, nada é mais natural, já que é a palavra grega que significa ciência. Mas essa palavra grega nunca foi usada comumente na Igreja latina para designar a teologia (exceto algumas vezes, como sinônimo, por alguns raros estilistas desejosos de evitar repetições).
O caso mais evidente é o de São Jerônimo, que estabeleceu a tradução latina, chamada "Vulgata", da Escritura. Quando ele se viu na necessidade de transpor a palavra "gnosis", frequente em São Paulo, ele se guardou bem de mantê-la tal como estava no latim e a traduziu por Scientia. A tal ponto que nem a palavra gnose nem a palavra "gnosis" se encontram nos dicionários de concordância. Isso prova que elas não eram utilizadas no latim eclesiástico do tempo de São Jerônimo. Sua adoção atualmente seria o tipo de inovação sob o pretexto de arcaísmo. Esse é um dos procedimentos dos modernistas.
Seria até extremamente perigoso usar essa palavra para designar a ciência divina, ou teologia, e isso por duas razões.
Primeiramente, por causa do conteúdo conceitual da gnose histórica que o termo não tardaria a trazer consigo. Ele veicularia toda a mitologia valentiniana e neoplatônica, como, por exemplo, os éons, a Sofia, o Demiurgo, a tripartição, o "Pai-Silêncio", etc. Realmente não precisamos de toda essa contribuição no momento em que a identidade doutrinária da Igreja já está bastante diluída no pântano ecumênico.
Além disso, a palavra é perigosa, independentemente do conteúdo conceitual histórico que ela veicula, e eis por quê. Na literatura neognóstica atual, a palavra gnose é polivalente, tem várias significações. Portanto, se fosse adotada na Igreja latina, seria empregada em vários sentidos, o que aumentaria sua maleficência.
Aqui estão os significados que encontramos na escrita dos neo-gnósticos, que os empregam indiferentemente, passando de um a outro sem avisar:
Gnose pode significar, primeiramente, a Ciência de Deus, no sentido livresco e discursivo do termo. Este é o sentido teoricamente inocente sob o qual se quer que aceitemos o termo.
Gnose pode significar também o Conhecimento intuitivo de Deus, aquele que a experiência mística pessoal proporciona. E a ambição dos neo-gnósticos é precisamente fazer dessa experiência uma das fontes da doutrina. Em suma, seria reconhecer um status equivalente entre a Revelação pública e a revelação privada.
Gnose pode designar ainda a Salvação pelo Conhecimento. O que proporciona a salvação não são mais "as obras da fé", mas o conhecimento. A pessoa é julgada, não mais por sua conduta, mas por seu conhecimento.
E como se obtém esse "conhecimento salvífico"?:
- simplesmente pela iniciação.
Diz-se então: «fulano adquiriu a gnose libertadora».
Gnose designa também uma atitude intelectual particular diante dos mistérios da Revelação. É uma atitude de Elucidação a todo custo. Nem a criação, nem mesmo a vida interior de Deus comportam mistérios que o espírito humano (que, aliás, é divino) não seja capaz de entender. Essa atitude é completamente estranha à Igreja, que ensina que os mistérios não são feitos para ser compreendidos, mas para ser contemplados. Essa é a verdadeira sabedoria.
Gnose designa finalmente, num sentido totalmente geral, a Teologia da religião universal à qual as sociedades de pensamento e as congregações iniciáticas trabalham mundialmente. Nesse sentido, gnose é sinônimo de esoterismo.
Como não ver que essa infeliz palavra serviria, afinal, para fazer penetrar na nossa "Ciência de Deus" todos os tipos de dados provenientes da falsa mística e do esoterismo mais heterodoxo? É tão evidente que se pergunta se esse não é precisamente o objetivo da manobra.
Uma tal adoção seria tão desastrosa para a doutrina quanto o novo "Ordo Missae" foi para o culto. Aliás, é provável que a Boa Gnose e o Novus Ordo saiam do mesmo frasco. Já foi suficientemente demonstrado que esse frasco é maçônico.
Jean VAQUIÉ